Conferência debate implicações e mudanças
“A Transposição do Novo Pacote Regulamentar e a nova Lei das Comunicações Electrónicas”
Reforço da independência do regulador, de forma a promover a inovação e o investimento. Gestão eficiente do espectro. Consolidação do mercado interno das comunicações electrónicas. Novo regulador europeu, o BEREC. Maior protecção aos consumidores. Segurança e privacidade das comunicações. Neutralidade tecnológica. Estas são algumas das novas medidas da nova Lei das Comunicações Electrónicas (LCE), analisadas numa Conferência da APDC que reuniu o regulador, operadores e juristas especializados nesta área.
Ferrari Careto, administrador da Anacom, dividiu os principais impactos da LCE em três blocos distintos: institucional, consumidores e concorrência. Quando à primeira vertente, destacou como aspectos com maior impacto o reforço da independência do regulador sectorial nacional, a par da necessidade da sua articulação com o BEREC e com a Comissão Europeia . Assim como o maior envolvimento destas duas entidades na definição de Poder de Mercado Significativo e a integração da segurança e privacidade das redes nas competências do regulador nacional. Já do ponto de vista dos consumidores, este é o grande enfoque do novo pacote. Nomeadamente na protecção aos cidadãos com necessidades especiais e a obrigatoriedade da portabilidade apenas num dia. Nesta matéria, adiantou que o regulador está a trabalhar no sentido de alterar o diploma da portabilidade, prevendo novidades para breve, através de um sentido provável de decisão.
Admitindo que as novas exigências implicarão um esforço acrescido dos operadores, deverá ser estabelecido pela Anacom um período de adaptação. Também a obrigatoriedade dos operadores publicarem toda a informação, o reforço dos mecanismos de reclamação, e a eventual inclusão no serviço universal da oferta de banda larga mostram a atenção dada por Bruxelas aos consumidores.
Já na área da concorrência, o representante da Anacom destacou a possibilidade de separação funcional agora preconizada na LCE como "remédio de último recurso". Assim como a criação de um mercado secundário de espectro, que traz "maior liquidez ao mercado", assumindo um papel vital no novo quadro para fomentar a concorrência. A neutralidade tecnológica e de serviços, a partilha de recursos e a integração numa lista única partilhada por todos os operadores dos clientes com dívidas são outras medidas importantes.
Mas para Ferrari Careto, "o grande objectivo da nova LCE é a criação de um mercado interno das comunicações" ao nível comunitário. O pacote não traz alterações radicais na forma como a Anacom está no mercado. "Não há uma refundação do regulador", garante. As maiores ameaças deste pacote poderão estar ligadas a questões financeiras e económicas, sobretudo na difícil conjuntura actual. Nomeadamente na retenção e atracção de talento para o regulador poder exercer as suas funções. É que à medida que o Estado vai saindo da economia, será necessária uma regulação forte para o mercado seja devidamente regulado.
PRINCIPAIS VANTAGENS E PROBLEMAS
Na conferência, vários especialistas de sociedades de advogados abordaram em detalhe algumas das mais importantes áreas da LCE. Luis Pais Antunes, da PLMJ, analisou os "Mercados relevantes e remédios", considerando que nesta área não há nada de verdadeiramente significativo. Mas destaca a segmentação geográfica como uma das vantagens do novo pacote, embora tema que nesta matéria as novas regras possam complicar ainda mais as coisas. Quanto à separação funcional, destaca que esta "é uma novidade com anos de atraso" e que o processo previsto é demasiado moroso e complexo.
A nova política de gestão do espectro foi abordada por Octávio Castelo Paulo, da SRS Advogados. A nova política preconizada pela LCE constitui uma "inversão e alteração grande em relação ao que tínhamos em vigor" no acesso ao espectro. E a lei identifica com clareza os critérios em que o regulador pode restringir a neutralidade tecnológica e de serviços. Destaca ainda como aspecto muito importante a possibilidade de transmissão e locação do espectro, embora nesta matéria existam várias interrogações e questões.
Já Margarida Couto, da VdA (e directora da APDC) analisou a temática da protecção do consumidor, privacidade e segurança de redes. "Este é um sector muito especial na economia portuguesa. Especialmente em termos legislativos. Há uma infinidade de regras que não existem em nenhum outro", começou por referir, criticando ainda o facto da Directiva sobre ePrivacy não ter sido ainda transposta para o ordenamento jurídico nacional. E alerta: "quando for, a vida dos operadores será mais difícil". Considera ainda excessiva a protecção dada aos consumidores de comunicações no novo pacote, num verdadeiro "crescendo intrusivo na relação entre consumidores e operadores". Nomeadamente através do enorme alargamento das obrigações dos operadores, de um reforço fortíssimo dos deveres de informação e de uma maior intromissão na autonomia contratual.
O novo regime sancionatório foi analisado por Nuno Peres Alves, da MLGTSS&A. Que se referiu aos dois tipos de procedimentos previstos no pacote em termos sancionatórios - o incumprimento e a contra-ordenação - assim como aos tipos de medidas em cada um dos procedimentos, desde a medida mais leve até à mais gravosa. Uma nova clarificação na lei é o facto de qualquer uma das medidas sancionatórias poder ser impugnada pelos operadores nos tribunais administrativos. E destacou o facto de, com a LCE, os operadores passarem a ser responsáveis pelos actos dos titulares dos seus órgãos sociais, direcções, chefias e trabalhadores.
IMPACTOS NOS OPERADORES
A mesa redonda que se seguiu, sobre os impactos no novo pacote para os reguladores reuniu os responsáveis de regulação da Vodafone, Cabovisão, PT, Optimus, Zon e Oni. Todos concordaram haver aspectos positivos e aspectos negativos. A excessiva ingerência na área da protecção ao consumidor, nomeadamente nos processos de reclamação, "quando os clientes das comunicações são dos mais satisfeitos do mercado", como referiu Cristina Perez (Vodafone) foi uma das críticas apontadas. Assim como as potenciais excepções ao princípio da neutralidade tecnológica e de serviços. Segundo Daniela Antão (Cabovisão), nos mercados regulados "estamos sempre a respeitar o 'menu' da Europa e deixamos de fazer coisas importantes. Tem-se feito pouco na intensidade da concorrência sustentável".
A separação funcional, agora prevista nos remédios dos reguladores, esteve também em evidência, sendo considerada por muitos uma possibilidade cujo timing já foi ultrapassado. A prestação do serviço universal de comunicações e a sua própria definição foram um tema forte deste debate. Com cada um dos intervenientes a defender a sua posição, nomeadamente sobre a questão da manutenção deste serviço no actual mercado, a concessão à PT e a eventual renegociação do contrato, num concurso aberto a todos os operadores, ou sobre o alargamento deste serviço à banda larga. Para Fernando Flores (PT), "até demonstrarem o contrário, a inclusão de banda larga no serviço universal não faz grande sentido".
Já todos foram unânimes em concordar que a base de dados comum a todos operadores com os clientes incumpridores é uma grande vantagem. Mas, para Filipa Carvalho (Optimus), "não estamos a falar de grandes alterações no mercado com o novo pacote. As alterações mais importantes já eram conhecidas. E reflectem duas ou três tendências que estão plasmadas em vários documentos, como o MoU." A articulação entre o regulador sectorial, o BEREC e a Comissão Europeia é também vista como positiva, desde que "salvaguardadas as questões de tempos de resposta e custos. Esta relação será importante para resistir a interesses mais corporativos em detrimento de interesses mais gerais, destacou Francisco Silva (Zon). Mas se "é positivo que a nova Lei tenha assegurado as condições de concorrência de mercado com uniformização de regulação. A preocupação principal prende-se com a desregulação de alguns mercados", afirmou Paulo Neves (Oni).
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