A mudança na banca está em marcha. Centrado cada vez mais no cliente, o setor aposta no digital, com uma estratégia multicanal e uma oferta cada vez mais personalizada que permita para dar resposta a novos tipos de consumo. As ferramentas TIC assumem um papel crucial, com a cloud e o big data em destaque. Condicionado pelas imposições regulatórias, que dificultam o processo, assim como pela necessária redução de custos num mercado em que as margens desceram abruptamente, o setor não tem dúvidas de que o caminho passa por ganhar agilidade e capacidade de resposta. Este é um trabalho permanente que impõe um novo modelo de negócio e mais investimentos. O digital e a mobilidade são tendências irreversíveis e há que saber fazer mais com menos, numa transformação que terá que ser inteligente e abrangente. Com ofertas cada vez mais simplificadas e inovadoras numa realidade que é cada vez mais complexa. Com o tema "Banca: para onde caminhamos", este Executive Breakfast reuniu os principais players do setor, que abordaram as grandes tendências e o papel das TIC neste ajustamento que se impõe, num debate moderado por Bárbara Barroso, do Dinheiro Vivo.
Os canais digitais tornaram-se mais relevantes e a sua importância vai aumentar nos próximos anos. Há ainda inúmeras oportunidades por explorar no negócio online da banca portuguesa, que tem que adotar uma visão de "Everyday Banking", garantindo uma interação em realtime com o cliente através de uma oferta multicanal. Para isso, o processo de virtualização terá que ser mais inteligente e assente no conhecimento, de forma a responder aos desafios e necessidades do cliente. A recomendação surge na sequência do "Estudo dos Custos de Tecnologias de Informação nas Entidades Financeiras em 2013", apresentado por João Pedro Tavares, vice-Presidente e responsável pela área de Serviços Financeiros da Accenture Portugal.
Este estudo, que visou proporcionar uma visão global de evolução dos custos e a utilização das TI, comparando a evolução entre 2008 e 2013 nos mercados português e espanhol, assume-se como uma ferramenta de suporte à gestão da tecnologia e aos seus custos. E revela que se registou uma forte redução dos custos operacionais, especialmente nos custos em TI .Com destaque para os cortes no desenvolvimento de novas capacidades para responder ao desafio digital, apesar de se assistir à adoção de serviços em outsourcing na gestão de infraestruturas e a um maior peso da tecnologia nos processos de negócio. Para o responsável da Accenture, perante a transformação do mercado, a tendência na banca terá que ser de reforço do investimento em cloud e na virtualização da operação para ser mais eficiente e reduzir custos.
Começando por destacar que o real time, o omnicanal, a virtualização e as soluções cloud são hoje desafios de todos os setores, Roland Thienpont, IP Cloud Networking Director da Alcatel-Lucent, considera que na banca estes desafios assumem uma importância fundamental. Este é um mercado onde o relacionamento com os clientes é cada vez mais digital e centrado na mobilidade, pelo que é preciso saber como trabalhar e potenciar o consumo através da Internet. A banca terá assim definir estratégias que permitam que o seu modelo de negócio evolua e ganhe flexibilidade. E o cloud computing assume-se como a solução para disponibilizar um leque alargado de produtos e uma oferta personalizada ao cliente. Num mercado que tem que oferecer o máximo de personalização da oferta e, ao mesmo tempo, conseguir reduzir os custos de gestão, há que encontrar a tecnologia certa para mudar processos e ofertas. O cloud permite ganhar escala e construir enormes redes com muitas aplicações e flexibilidade total.
ESTRATÉGIA MULTICANAL E REGULAÇÃO NO CENTRO DAS ATENÇÕES
Sendo o Best um projeto de banda online, a estratégia desde o seu arranque, em 2011, tem passado por desenvolver uma forte presença na Internet, articulada com um marketing e publicidade muito forte e que permita a diferenciação. Como explica Isabel Ferreira, presidente da Comissão Executiva do Banco Best, há que ter processos que impactem todos os potenciais clientes através da oferta de conteúdos apelativos para potenciar a sua adesão. E ter organização em que os vários canais estejam articulados e com objetivos muito definidos. Ou seja, ter "um multicanal inteligente e integrado, assente não só em tecnologia mas numa arquitetura técnica que nos permite passar de um canal para outro", e um sistema de governance, assim como uma gestão de conteúdos eficiente. Acresce "o processamento a sério de big data, para permitir previsibilidade".
Mas esta responsável não tem dúvidas de que, de uma forma geral, a produtividade da banca é hoje um dos temas fundamentais. E o problema não está na componente de backoffice ou no custos de TI mas sim na distribuição. "Dos custos operativos bancários, 55% são pessoas que estão nos balcões. É a realidade", adianta, considerando que esta será a área "onde vamos assistir a uma reformulação enorme em Portugal. Temos muito que fazer", pelo que haverá muitas reestruturações ou reformas nos próximos tempos. Até porque se atingiram "níveis de return of equity baixíssimos", pelo que o caminho será aumentar a eficiência através da redução dos custos.
Num banco tradicional como a CGD, a ‘chave' da mudança para o digital está no equilíbrio. Maria João Carioca, membro da Comissão Executiva do banco estatal adianta esta evolução passa por disponibilizar um leque muito alargado de soluções que deem resposta aos diferentes clientes e às suas necessidades. No fundo, uma "abrangência proactiva", disponibilizando soluções para necessidades diferentes. "Não vemos a evolução dos canais como uma coisa que tem que ser precipitada. Essa é a melhor receita para a desgraça", explica.
Começando por destacar que o produto bancário baixou 40%, Rui Teixeira, membro da Comissão Executiva do MillenniumBCP, não tem dúvidas de que há que mudar, tendo em conta que o comportamento dos clientes também está em transformação. Mas essa mudança terá que ser feita com prudência, no sentido de conseguir mais negócio. "É este passo que falta dar e que não estamos a conseguir. E tem que se fazer", sendo que as ferramentas de TI têm dado aqui um forte contributo. Mas estão a ser ainda subutilizadas pelos bancos, que foram "claramente ultrapassados pelos retalhistas e pelas telecoms". Para este responsável, a banca tem que acelerar o processo de digitalização, através de ferramentas e processos muito mais inteligentes e que vão para além das TIC.
"Por muita digitalização que exista, há sempre pessoas. Porque há muitos processos que são complexos". Por isso, continuará a haver muitos balcões físicos, combinados com outros canais, permitindo um maior contacto com o cliente. "Temos que ter uma vertente omnichannel. Esse é que é o grande desafio. E as ferramentas TIC são determinantes para que isso aconteça. Com inteligência por detrás", salienta, de forma a conseguir "extrair mais valor, mais negócio e mais relação com o cliente da utilização das TIC. E esse é o grande desafio. Temos que ser menos com mais produto bancário".
Também João Leite, membro Comissão Executiva do Santander Totta, não tem dúvidas de que é fundamental para a banca centrar-se no cliente. Aplicando todas as tecnologias, como o big data, que permite perceber as tendências, até ao multiple touch point, para ter várias formas de comunicar com o cliente. Esta é uma estratégia que vai também o setor a lidar com uma regulação que é "exagerada e cria alguns constrangimentos. Podemos dizer que grande parte dos orçamentos de TI na banca continuará a dar resposta aos termos regulatórios", adianta. O que terá que ser feito em paralelo com outros investimentos. Nomeadamente a migração dos centros de dados para a cloud ou a aposta no multicanal, para dar ao cliente todas as opções e a informação possível para que possa tomar as suas decisões. Para isso, é fundamental passar de uma visão de produto para "uma visão holística do cliente e das suas relações com o banco". No tema da regulação, a líder do Banco Best também defende que ao nível local terá que haver maturidade, diálogo e confiança. "Temos regulamentações que muitas vezes são claramente exageradas. Mas há esperança", considera.
Esta expetativa é partilhada pelo seu diretor-geral do BPI, Francisco Barbeira para quem o tema da regulação tem tornado o processo de mudança na banca mais lento. Mas acredita que esta evolução será feita necessariamente. "Se é verdade que estamos preocupados com a sustentabilidade do negócio e com o return of investment, os reguladores também estão", pelo que a regulação terá que evoluir para dar resposta ao mercado. A estratégia do BPI para o digital não diverge da dos concorrentes. Há que olhar para os vários canais não numa lógica de substituição mas de complementaridade, para que o cliente escolha o que mais satisfaz a sua necessidade. E o gestor não tem dúvidas de que nos últimos anos houve uma transformação no setor, que passou a centrar-se cada vez mais na experiência que consegue entregar ao cliente e menos no produto em si. O que significa que "os canais e a forma como interagem com os clientes e entre si está no foco da atenção do IT e de todo o negócio. O desafio é o equilíbrio", adianta.
A migração para a cloud é vista não como um tema de custos mas de agilidade. "Se tudo está centrado na experiência, a agilidade com que a entregamos é fundamental. O grande desafio das organizações de IT e das instituições financeiras é serem ágeis", explica. Por isso, o banco tem mesmo aumentado os seus investimentos em TI, estando as suas prioridades alinhadas com as dos concorrentes. "Temos uma preocupação muito grande em fazer mais com menos. Diminuindo ou mantendo os custos do IT e conseguir ser mais ágeis", pelo que temas como a cloud e o big data estão no centro das atenções. "O digital passa seguramente por entregar canais e experiencias. Mas esta só é rica se baseada num conhecimento profundo do cliente", explica. Por isso, o digital, mobilidade e complementaridade de canais são fundamentais no budget dos próximos anos.