Evento APDC

18.02
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12ª Sessão do Digital Union | APDC & VdA

Cabos Submarinos e as Oportunidades para Portugal: Regulação e Estratégia

Portugal e a Europa tem uma enorme oportunidade para se afirmarem globalmente no negócio nos cabos submarinos. O desafio é criar as adequadas condições para atrair investimentos, numa altura em que as big techs apostam forte nesta indústria e lideram em termos de projetos. Colaboração, trabalho em ecossistema e criação de parcerias público-privadas são o caminho apontado. Há também de saber endereçar o problema da fragmentação das regras na UE27, reforçar a governance, definir guidelines e standards e adotar regras e um quadro regulatório que garanta maior rapidez, simplicidade e eficácia. 

O relatório da CE sobre o Estado da Década Digital em 2023 mostra que cerca de 99% das comunicações digitais mundiais transitam através da rede global de cabos e cerca de 10 biliões de dólares em transações financeiras são enviados diariamente através deles. O que mostra que os cabos submarinos constituem a espinha dorsal da internet mundial, já que permitem a transferência de dados a alta velocidade entre países e continentes. São eles que suportam a infraestrutura necessária para os serviços cloud, a IoT, a IA e outras tecnologias emergentes, tendo um impacto direto no crescimento económico e na melhoria da conetividade digital e na troca de informações.

Esta relevância dos cabos submarinos foi destacada por Rui Almeida, Associado da Área de Comunicações, Proteção de Dados & Tecnologia da VdA, no arranque de mais uma sessão do Digital Union, uma parceria entre a APDC e a VdA para analisar as políticas e a regulação na Europa e em Portugal.  O orador fez um ponto de situação sobre o que está a acontecer na UE27 e em Portugal, traçando ainda perspetivas sobre as oportunidades da indústria dos cabos submarinos. 

Tendo em conta a atual cobertura em fibra, da rede de satélites e o desenvolvimento do 5G, a Europa enfrenta ainda vários desafios em termos de infraestruturas de conetividade. De tal forma que os objetivos definidos para a Década Digital para 2030 serão difíceis, senão impossíveis, de alcançar se não forem tomadas medidas. Há que colmatar o fosso entre a procura de conetividade e as atuais infraestruturas, seja através de novas redes, seja com uma atualização significativa das que já existem, num caminho que terá de passar, obrigatoriamente, pelos cabos submarinos. 

E Bruxelas, segundo o orador, tem consciência dessa necessidade, já que tem apostado, através do CEF Digital, no investimento nesta área. Nomeadamente com o Digital Work Programme, que na primeira edição, entre 2021 e 2023, financiou em 285 milhões de euros 20 projetos de cabos submarinos. Já na segunda edição do programa, entre 2024 e 2027, foram até agora apoiados mais seis projetos. 

Portugal tem na indústria de cabos submarinos oportunidades e vantagens estratégicas, resultantes da sua proximidade à América do Norte, Brasil e África, assim como da sua extensão marítima de cerca de 4,1 milhões de km2. Atualmente, entre 15% a 20% de todos os cabos submarinos já passam pelo país, e o potencial de aumento do PIB, pelas contas da Copenhagen Economics, é de 500 milhões de euros por ano. 

O grande desafio está em conseguir equilibrar inovação com regulação em termos de políticas europeias, já que a situação atual não é, de longe, a mais adequada para promover o investimento, não só em cabos submarinos, mas nas infraestruturas digitais em geral. Citando o relatório Draghi sobre a competitividade europeia, Rui Almeida refere que "a regulação é vista por mais de 60% das empresas da UE como um obstáculo ao investimento. Sendo que 55% das PME assinalam os obstáculos regulamentares e a carga administrativa como o seu maior desafio".

GOVERNAÇÃO E REGULAÇÃO: MUDAR É PRECISO
Perante esta constatação, impõe-se uma revisão da governação da UE, reforçando-se a coordenação entre os estados-membros e reduzindo-se a pesada carga regulamentar, no sentido de ser "mais eficiente e eficaz". O próprio BEREC admite que a implantação de sistemas de cabos submarinos depende atualmente do "cumprimento de um número significativo de procedimentos administrativos de autorização nacionais, incluindo a proteção do ambiente e do património cultural, o planeamento e a gestão dos recursos marítimos e o planeamento e a gestão urbana e territorial e gestão do território", concluindo que só as licenças e autorizações facilmente ultrapassam um ano de duração. Isto para não falar do cumprimento de todo um quadro regulatório para a instalação das infraestruturas físicas, que envolve um conjunto de regras que, também elas, são desincentivadoras dos investimentos. 

Daí que, como explica o responsável da VdA, o Gigabit Infrastructure Act, que será aplicável na sua totalidade a partir de 12 de novembro deste ano, tenha como objetivo simplificar e acelerar a implantação de redes de comunicações eletrónicas de alta velocidade, fixas ou móveis, de forma a cumprir os objetivos da Década Digital da UE em termos de infraestruturas de muito alta capacidade até 2030. E sendo as novas regras diretamente aplicáveis aos estados-membros, sem necessidade de transposição, são esperadas grandes novidades em termos de investimentos em cabos submarinos. 

Já ao nível nacional, Rui Almeida destaca ao despacho do Governo nº 11808, de 2023, que vem estabelecer um conjunto de ações destinadas a simplificar o processo de instalação de cabos submarinos e de infraestruturas associadas. A meta do despacho foi garantir a melhoria da conetividade internacional do país, sendo que a proximidade dos centros de dados permitirá melhorar a qualidade das redes de muito alta capacidade para os cidadãos e as empresas acederem à internet e aos serviços. Assim como apoiar o desenvolvimento de indústrias tecnológicas e da localização de empresas de base tecnológica.

O despacho assenta em três pilares de ação: energia, fazendo do país uma referência mundial no domínio da economia digital, assente na utilização de energia vinda de fontes renováveis; comunicações e conetividade, reforçando o desenvolvimento e apoio de iniciativas que melhorem o posicionamento estratégico nacional na conetividade internacional; e ao nível da informação e dos dados, para garantir a Portugal uma posição de destaque na localização de centros de armazenamento e de processamento de dados. 

Segundo o orador, o país quer tirar partido da sua localização estratégica na Europa, com coordenação institucional entre todas as entidades envolvidas. O reforço das infraestruturas e regulação é outra meta, criando-se zonas específicas para cabos submarinos e a simplificação dos processos de licenciamento, através de um portal específico para investidores. Promover a integração das energias renováveis no ecossistema digital, para atrair investidores globais, e estimular o desenvolvimento de rotas alternativas, para aumentar a conetividade e a segurança são outros objetivos.

COLABORAR EM ECOSSISTEMA PARA ACELERAR
Mas, quando a gigante Meta acaba de anunciar o seu investimento mais ambicioso nos cabos submarinos, com o projeto Waterworth, que vai ligar os EUA, Índia, África do Sul, Brasil e outras regiões do globo, como olham os operadores para a concorrência das big tech?  E como se posicionam? Quais os entraves que identificam, assim como as oportunidades?

Estes foram temas abordados no debate que se seguiu, onde todos defenderam que a colaboração e o trabalho em ecossistema, assim como a criação de verdadeiras parcerias público-privadas, são o caminho para que a Europa - e Portugal - possa ter um papel preponderante em termos mundiais nos cabos submarinos. Para isso, há que endereçar o problema da enorme fragmentação das regras na UE27, assim como reforçar a governance, ter guidelines  e standards europeus, adotar regras mais rápidas e simplificada e aprender efetivamente uns com os outros.

Ana Carla Sousa, Wholesale Director da MEO, não tem dúvidas de que os países mais conectados são os que são mais desenvolvidos, produtivos e democráticos, assumindo um papel importante no desenvolvimento e crescimento global. E, quando se enfrenta um enorme processo de transformação digital, os cabos submarinos assumem um papel fundamental, já que a produção de dados está a disparar e é preciso aceder a eles de forma mais rápida e confiável. 

A necessidade de banda larga internacional, entre 2019 e 2023, multiplicou-se por três, num "espantoso crescimento que vai continuar" e que é central neste processo de transformação. Para a oradora, há uma forte procura de largura de banda e para aceder aos dados de forma segura e fiável, os datacenters são essenciais. 

Há ainda outra a mudança visível: se há 10 anos, os players chave no negócio dos cabos submarinos eram os operadores de comunicações, hoje os gigantes de internet já detêm mais de 75% do investimento nesta indústria. E embora os operadores continuem a ter um papel importante, mas não estão já a investir da forma tradicional, de partilhar capacidade em consórcio, mas sim estamos a investir com as tecnológicas. "Precisamos de investir e se estar presentes neste negócio, assim como fornecer serviços ao mercado. Podemos ser parceiros e ser também service providers. É o que estamos a fazer", diz. 

Robert Marshall, Security Policy Advisor do grupo Vodafone, acrescenta que reguladores e governos reconhecem que este é o momento de tirar partido das oportunidades dos cabos submarinos, incluindo em Portugal, que poderá ter a vantagem de ser dos primeiros da Europa a avançar. Mas ainda tem de se definir qual a melhor estratégia para endereçar esta oportunidade. 
O primeiro passo terá se ser uma alteração de fundo no quadro regulatório europeu, "para que todos os intervenientes do mercado tenham o mesmo enquadramento e os mesmos standards, o que trará mais consistência e segurança". Atualmente, a regulação está demasiado fragmentada, existindo grandes disparidades entre os vários estados-membros. Acresce o tempo das licenças e autorizações, em média de até 14 meses, o que acaba por prejudicar os operadores face às tecnológicas, que têm capacidades quase ilimitadas de investimento.

Olhando para a Europa e para Portugal, o gestor que as possíveis soluções passam pelo reforço da colaboração, juntando todas as partes: setor privado, governos e reguladores. "Todos temos de ser parte do debate e dos planos de futuro. Fazendo parte das soluções", destaca, salientando que esta é a oportunidade de endereçar o problema. "não podemos estar isolados. Todos temos os mesmos problemas. As redes têm de acontecer mais depressa todos temos de olhar, juntos, para uma nova legislação mais adequada", alerta.

"A Europa precisa de reforçar a governance. Precisamos de ter guidelines europeias, para uma aproximação mais eficiente entre todos os países. Porque todos queremos o mesmo, um processo consistente e eficaz, com standards harmonizados aplicáveis a todos. Estamos a falar de uma maior simplificação ao nível europeu. Esta é uma oportunidade real", remata.

NOVA APROXIMAÇÃO ESTRATÉGICA
E qual o papel da ANACOM nos planos nacionais para as infraestruturas digitais e para a atração de investimento, posicionando Portugal como um hub nos cabos submarinos? Para Augusto Fragoso, diretor-geral de Informação e Inovação do regulador, a ANACOM assume um papel vital numa área que tem uma enorme relevância geoestratégica. Estas são infraestruturas vitais e críticas, pelo que se "impõe uma nova aproximação estratégica a estas redes". Neste âmbito, defende que "a colaboração é a resposta", pelo que o regulador tem trabalhado muito de perto com o governo, organismos europeus e com a UE, no sentido de ter uma melhor ideia do que serão as necessidades do futuro em termos de conetividade e uma nova estratégia de abordagem das redes. 

"Em termos de conectividade internacional, quando falamos de cabos, há vários fatores que observamos. O primeiro é ‘seguir o dinheiro' e aqui vemos que os investimentos vêm das relações entre a UE e os EUA. A capacidade instalada também tem de mudar rapidamente, porque muita dela ainda funciona da forma tradicional. Temos ainda de pensar que quando os dados chegam às nossas costas, temos de ter caminhos estratégicos na Europa. Temos de pensar na conetividade, tanto no mar como em terra", considera o responsável do regulador.

Já na cobertura nacional, diz que a questão é saber "para que queremos a conetividade. Tem de ser construída para desenvolver os vários mercados e setores. Se não garantirmos no país investimentos na indústria dos dados, então estamos a construir autoestradas onde não podemos ter nem a barraca das bifanas. Pelo que há que pensar em áreas como o desenvolvimento da IA. Mas estaremos a pensar estrategicamente no país e na Europa? Falei com vários analistas e as oportunidades que vêm no investimento em IA na Europa são as mesmas que nos EUA ou noutras geografias. Com a diferença que estes não querem investir na Europa, porque a regulação da IA está a assustá-los". 

Há assim de saber "encontrar formas de garantir que os investimentos cheguem à Europa. Uma das tendências dos hyperscalares é que começam a mover os projetos para locais com energia mais barata e sustentável. Portanto, é tempo de vermos uma maior ligação entre a capacidade da energia verde e a construção de infraestruturas de datacenters. Será Portugal o local certo para instalar este tipo de infraestruturas? Diria que estamos muito bem colocados e temos um papel importante a desempenhar. E a atual situação geopolítica poderá levar a novas decisões em termos de infraestruturas globais, com vantagem para o país".

Para suportar esta visão, destaca que a ANACOM está a apostar na simplificação regulatória, com diferentes ferramentas, obrigações na segurança e no acesso e harmonização com as regras europeias. Além de apoiar as iniciativas que estão a ser desenvolvidas, nomeadamente tentando juntar todos os Um dos exemplos são os contactos com os promotores de novos projetos que ligam a Europa a outros continentes, "porque acreditamos que o novo backbone entre o hemisfério Norte e o Sul, os Açores e Madeira terão um papel essencial".

Ana Sousa destaca o custo dos projetos e a importância da previsibilidade. "Trabalhamos arduamente todos os dias para atrair investimentos para Portugal. Não só nos cabos, mas também no reforço do ecossistema, porque precisamos de ter as redes interconectadas no país, para desenvolver o ecossistema inteiro, criando um verdadeiro hub português". Nesse processo, o grupo vê que "o que os investidores querem é previsibilidade. O tempo é dinheiro e na indústria dos cabos tempo significa muito dinheiro".

Assim, defende que têm de se endereçar os obstáculos que afastam os investidores, até porque o novo framework europeu tem medidas muito boas. E destaca um ‘game changer': a criação de corredores, uma medida muito positiva. Mas será necessário ir mais além, se o objetivo for ganhar competitividade face a outros mercados e países que também estão a atrair este tipo de investimentos. Dar previsibilidade aos investidores é fundamental, porque estes não querem ter custos extra". 
Destaca ainda a importância das demais infraestruturas, como os datacenterts e as carrier houses. Também aqui os estes processos terão de ser acelerados. Assim como as medidas de segurança, que têm se ser acauteladas, "colaborando mais em todas as áreas. E isto que pode fazer a diferença quando estamos a concorrer por estes investimentos".

O responsável da Vodafone concorda que o estabelecimento de corredores é uma grande mais-valia em termos de assegurar a segurança das infraestruturas submarinas. Assim como com a necessidade de uma abordagem europeia harmonizada, com partilha de informação para garantir a resiliência e a redundância das redes. 

Respondendo à questão dos participantes sobre se a simplificação regulatória será o caminho para promover o investimento em cabos submarinos em Portugal, Augusto Fragoso diz que acredita que desempenhará um papel importante. Mas não é o aspeto principal para que Portugal possa ser considerado um player importante. A localização, a certeza e aspetos como a atratividade regulatória são considerados mais relevantes. Diz que o despacho governamental de 2023 estabelece a relação entre várias dimensões que precisavam de ser percebidas e interligadas, em termos de atratividade: energia, dados e conetividade.

Destaca ainda a criação do portal único para os investidores, que se assume como um one stop shop que irá simplificar o processo. Garantirá apenas um único local com toda a informação para todos os diferentes players envolvidos no processo e uma visão clara do que será necessário fazer no processo. E trará todo o conhecimento específico concentrado numa única plataforma, com um único ponto de contacto. 

Já em termos de investidores, considera também importante mostrar a capacidade do país em termos de infraestruturas de comunicações. "O que a Anacom está a fazer é promover e suportar a cobertura em termos de redes de comunicações no país, nomeadamente em termos de fibra ótica. Mostrando aos investidores a forma como o se está a trabalhar profundamente a conectividade nacional", explica. 

A grande quantidade de projetos de cabos submarinos liderados por big techs colocará riscos, na atual situação geopolítica? O que poderão os governos, reguladores e operadores europeus fazer? Robert Marshall refere que esta não é uma questão fácil de responder, mas há que reconhecer o poder das tecnológicas nesta área. Pelo que o tema regulatório terá de ser endereçado, assegurando-se que todos os players têm o mesmo quadro de regras a cumprir, sem divergências, o que trará um nível de consistência grande para suportar os níveis de investimento.

Depois, acredita que a Europa terá de apostar cada vez mais em parcerias público-privadas, para construir projetos consistentes. Com a obrigatória criação de mecanismos mais consistentes de financiamento ao nível comunitário, para o desenvolvimento de projetos mais estratégicos. É que esta é a oportunidade de endereçar estes temas, porque a Europa tem um papel nesta área. E não se pode perder tempo.

 

 

 

PROGRAMA
 

09h30 Boas-vindas
  Tiago Bessa - Sócio da Área de Comunicações, Proteção de Dados & Tecnologia e da Área de PI Transacional, VdA
Sandra Fazenda Almeida - Diretora Executiva, APDC
   
09h35 Cabos Submarinos e as Oportunidades para Portugal: Regulação e Estratégia
  Rui Gordete Almeida - Associado da Área de Comunicações, Proteção de Dados & Tecnologia, VdA
   
10h00 Debate
  Ana Carla Sousa - Wholesale Director, MEO
Augusto Fragoso - Diretor-Geral de Informação e Inovação, ANACOM
Robert Marshall - Security Policy Advisor, Vodafone Group
Oradores a anunciar

Moderação:
Cindy Barardo - Gestora de Eventos, APDC
Tiago Bessa - Sócio da Área de Comunicações, Proteção de Dados & Tecnologia e da Área de PI Transacional, VdA
   
11h00 Encerramento

 

 

 

 

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