O setor segurador ainda tem um longo caminho a percorrer para dar resposta aos desafios de um mundo digital. Desde a capacidade de perceber o cliente e as suas necessidades à transformação interna, passando pela captação de talento e a adoção de estratégias mais disruptivas. Mais do que uma evolução, este é um processo de transformação. Onde as soluções tecnológicas - que estão disponíveis - ocupam um papel central. Há casos em que o ideal era ter uma folha em branco e redesenhar tudo. E é preciso acelerar a velocidade da mudança, sob pena poder surgir, entretanto, uma ‘Uber' dos seguros.
Responsáveis das TIC e das seguradoras analisaram neste Digital Business Breakfast os desafios e oportunidades do setor segurador, nomeadamente com o processo de transformação para o digital. Num mercado em profunda mudança, marcado por fusões e aquisições, reestruturações, reforço das exigências regulatórias e de supervisão e novos perfis de consumo, as seguradoras do mercado nacional estão a redefinir estratégias e ofertas para garantir o negócio e o seu futuro. E se o potencial que a tecnologia pode trazer é enorme, nomeadamente para conhecer o risco e o cliente, é enorme, o ritmo da mudança é lento. Mas é preciso avançar definitivamente para uma nova forma de fazer negócio.
Neste encontro, Rodrigo Maia, CTO da Altran Portugal, começou por destacar as tendências globais que resultam do digital, nomeadamente as novas gerações, que vivem com a tecnologia e querem novas ofertas e propostas, assim como um relacionamento diferente e imediato. Com informação que seja útil. Estar sempre ligado e ser socialmente ativo são também tendências que estão a obrigar as empresas de todos os setores, incluindo o segurador, terão que enfrentar e perceber. Desenvolvendo as necessárias respostas que lhe garantam o negócio.
Isto numa conjuntura em que a pressão sobre a rentabilidade do negócio é cada vez maior, em resultado de fatores como o mercado, a regulação, o menor retorno dos investimentos e o desafio da retenção dos clientes. Para o keynote speaker, a realidade atual implica uma complexidade cada vez maior que obriga a novas ferramentas e novas tecnologias. IoT, cloud e analítica são essenciais e incontornáveis para definir o futuro. Garantem segmentação, aprendizagem, predição e otimização, numa altura em que o big data está a explodir, sendo necessário transformar os dados em informação e em conhecimento útil para o negócio.
Acresce um crescente engagement entre empresas e clientes, o que passa por uma presença ativa no digital, nomeadamente nas redes sociais. Neste cenário, empresas como a Altran estão a trabalhar em parceria e a desenvolver soluções à medida deste mercado, dando-lhe as necessárias respostas para ganharam capacidade de garantirem o negócio.
Já João Moradias, Sales Executive da Hewlett Packard Enterprise, e também keynote speaker, começou por destacar as quatro tendências identificadas pelo Estudo Tendência APDC sobre o setor - visão global do que é a realidade de cada um dos clientes e agentes; capacidade de haver novos produtos para a proteção de risco; qualidade do contacto do cliente; e estratégia digital que crie uma maior capacidade".
São tendências e preocupações que não são de agora, mas que ganharam nova dimensão com a velocidade da transformação potenciada pelo digital. Hoje, existe um verdadeiro "universo de dados a surgir e este potencial disponível é uma tendência e um desafio para as seguradoras". A estas impõe-se ganhar capacidade de se transformar para ter todos os meios - tecnológicos, organizacionais e competências individuais - para transformar os dados em conhecimento, crescendo e garantindo um negócio sustentável, com ganhos de quota, otimização da operação, redução dos riscos e limitação dos processos de fraude. E também no que respeita à HPE, as ofertas tecnológicas específicas para o setor segurador estão disponíveis. Com dois princípios fundamentais: o cliente não é uma folha em branco e a proposta tem que ter um valor importante.
EVOLUÇÃO OU REVOLUÇÃO?
No período de debate que se seguiu, moderado por Filipe Ribeiro, dos CTT, os vários responsáveis dos players do setor foram unânimes em admitir que, apesar da evolução registada, as seguradoras têm ainda um longo caminho a percorrer. É que se as soluções tecnológicas existem e estão disponíveis, impõe-se definir estratégias, mudar a cultura interna, alterar procedimentos e saber como e para quê se vão usar as TIC. A captação de talento foi considerada uma questão essencial para as novas ofertas disruptivas, perante a ameaça do surgimento de uma ‘Uber' dos seguros que perceba o cliente e lhe dê a solução mais personalizada, costumizada e com valor.
Para Susana Pascoal, Diretora de Marketing e Inovação da Lusitânia, um ponto fundamental é perceber as mudanças de comportamento dos clientes e a forma como as seguradoras se podem adequar. O que não é fácil num mundo cada vez mais digital, onde se exige capacidade de tratar os dados e ter conhecimento com valor. Acresce que a mudança que se impõe não está a ocorrer à necessária velocidade dentro das organizações. Este é um caminho que ainda está por fazer e é aí que nos temos que focar", destaca.
Admite até que as seguradoras, "ainda que o queiram muito, não trabalham o conceito de cliente", mas sim de apólice, o que também terá que mudar para um novo paradigma. E aqui, as tecnologias serão essenciais para o setor ir mais longe. "Temos que ver cada vez mais os produtos como serviços com valor acrescentado. Prestamos serviços úteis, para quem compra e quem usa", ressalta. Até porque correm o risco de ter novas concorrentes no negócio, com propostas disruptivas.
Sobre a utilização da tecnologia, Rui Palma, Diretor Geral da Direção de Tecnologia e Informação da Açoreana, considera que os seguros estão "numa encruzilhada" e há que decidir: continuar a fazer mais do mesmo ou partir para um processo de reconstrução. É que as empresas ainda estão presas a um conjunto de tecnologia legacy e a processos e formas de funcionar.
Numa altura em que se impõe mais repensar a forma como a tecnologia atua, nomeadamente "desconstruir o IT, para ser mais arriscado, flexível e rápido". Também ao nível do multi-canal, que foi evoluindo com o mercado, "o ideal era ter uma folha em branco e redesenhar tudo". No entanto, há que ponderar todas as necessidades.
Sendo o projeto da LOGO digital, o seu administrador, José Pedro Inácio, não tem dúvidas de que "todos os clientes são digitais e querem exatamente a mesma experiência se estiverem no site da Amazon ou no site da seguradora". Por isso, as seguradoras têm que pensar diferente, O que não se faz com evoluções, mas com transformações, no que considera mesmo uma revolução. Já não potenciada pelo IT mas sim pelo negócio, sendo o IT um enabler.
Para este responsável, "tudo quisermos fazer, a tecnologia permite-o. Só nos falta a proposta de valor para o cliente". E isso implica uma nova forma de fazer negócio. O segmento da saúde é um dos que oferece mais potencial e onde se pode fazer uma abordagem completamente diferente, dando "uma verdadeira experiência" do cliente. Destaca ainda a importância da captação de talento. "Precisamos de pessoas que construam negócios diferentes. Senão, será uma ‘Uber' dos seguros a fazê-lo", alerta.
Eduardo Romano, CIO da Liberty, também não tem dúvidas de que o talento é muito importante. Mas é também muito difícil captá-lo para a nossa indústria, que é muito cinzenta. E considera até que o setor tem que pensar em posicionar-se como disruptor do mercado, promovendo nomeadamente a criação de startup's com soluções para os seguros e as tecnologias emergentes.
Considerando que se estão a viver "tempos interessantes", adianta que há todo um potencial trazido pela tecnologia que é preciso aproveitar, para se conhecer melhor o risco e o cliente. "Ainda estamos longe de o conseguir fazer. Mas lá chegaremos", até porque todos vão continuar a tentar perceber a as novas dinâmicas do mercado e ganhar novas competências. O que significa, para o IT que "se já estamos a correr uma maratona em regime de sprint, temos que ter a consciência de que não vamos abrandar, mas sim acelerar o ritmo do sprint".