Estas foram algumas das conclusões do Executive Breakfast sobre "Transportes: um setor em convergência", que reuniu os principais players do setor. Onde foram abordadas as grandes tendências, como o foco no utilizador, a necessidade de gestão e otimização dos ativos, a crescente virtualização e a integração em sistemas de mobilidade para garantir cidades inteligente. Estes foram também os principais desafios identificados no estudo "Tendências", da APDC, cuja análise se centrou nas infraestruturas de transportes e nos operadores de transportes coletivos, analisando-se quatro grandes segmentos - Ferroviário, Aeroportuário, Rodoviário, Marítimo-Portuário.
A grande tendência nos transportes é o crescimento da população mundial, que colocará uma pressão acrescida sobre o setor. Estima-se que em 2020, 60% da população viverá nas cidades e já é visível o aumento do número de passageiros em todos os tipos de transportes. O desafio é pensar como construir uma infraestrutura gerível para tanta gente, refere Mike Greenan, Rail and Transport Infrastructure Director da Altran e Key-note Speaker do Executive Breakfast da APDC sobre "Transportes: um setor em convergência". Para este responsável, que apresentou o tema "Transports: Trends and Challenges - Opportunity for Innovation", há que "construir ativos físicos cada vez mais eficientes, fornecer melhor conetividade e gerar mais dados a partir dos seus ativos". E este é um grande desafio para todos os protagonistas, tendo em conta que já hoje é muito difícil gerir o sistema e o tráfego está a crescer todos os dias.
Esta é uma oportunidade para a inovação. Especialmente através de uma utilização inteligente dos dados que são gerados, tanto pelos ativos como pelos passageiros e pelos seus dispositivos. Podem ser analisados e convertidos em informação para usar na transformação do sistema de transportes num sistema ultra-eficiente. Criando-se nomeadamente novos sistemas mais complexos e sustentáveis, como na área da bilhética.
"Hoje, só olhamos apenas para uma pequena parte dos dados produzidos. Mas no futuro, teremos que olhar cada vez mais para eles e saber como os usar para melhorar o sistema", refere, destacando que a dificuldade está em gerir um sistema ultra complexo. É que exige uma "nova forma de pensar para sabermos como gerir melhor o setor" e uma "nova forma de pensar a infraestrutura". Mas há aqui um enorme potencial.
ACELERAR MUDANÇA É PRECISOMas como estão os operadores a olhar para o mercado? E como vêm o futuro? Numa sessão de debate moderada por Bruno Casadinho, da Altran, onde estiveram presentes representantes dos operadores de infraestruturas e de transportes, o debate foi aceso em torno da necessidade de mudança, das tendências dominantes e do papel das TIC no desenvolvimento e no futuro deste mercado. Cada vez mais focados no cliente e nas duas necessidades, os players não têm dúvidas de que o setor está em profunda transformação. E de que as TIC deverão assumir-se como um verdadeiro parceiro num processo de evolução/disrupção.
Começando por discordar do KNS, já que não antecipa tanto em Portugal como na Europa nenhuma tendência demográfica significativa em termos de aumento dos volumes de mobilidade das pessoas, António Ramalho considera é que haverá uma tendência de reorganização e concentração dos centros urbanos. Que irão responder também ao natural e significativo aumento da mobilidade virtual, em resultado de um mundo cada vez mais digital. O presidente da Estradas e Portugal e da Refer, futuro líder da Infraestruturas de Portugal, que resultará da fusão das duas empresas, antecipa que haverá alterações substanciais na mobilidade urbana, através do incremento significativo das penetrações do transporte público, e de um aumento dos soft modes de transportes partilhados.
O gestor não tem dúvidas de que "vamos ter que concentrar conceitos novos do ponto de vista de mobilidade global". Que dependerão das características próprias de cada cidade. "Vamos ter que compatibilizar a gestão dos fluxos e das frequências, destruindo os horários, no caso dos transportes de concentração urbana. E vamos ter que trabalhar a reconstrução dos horários dos transportes intercidades. Isto vem alterar o paradigma do modelo da mobilidade", ganhando a mobilidade de mercadorias uma nova dimensão. Cada vez mais, na sua ótica, os transportes vão deixar de dar prioridade ao ambiente para se centrarem num modelo energético.
Considerando o atual sistema de transportes "um modelo claramente dos anos 60 e que está a ir calmamente à falência", adianta que terá que se ajustar a uma nova realidade que não é de crescimento. "Vamos ter que ajustar as respostas a mobilidades diferentes", de acordo com os movimentos que o mercado impõe. O que "não retira nada da importância da adoção de soluções co-modais. E vamos tê-las, sobretudo porque a gestão de infraestruturas se vai basear em dois conceitos: serviços ajustados e low-cost. Inevitavelmente, estas serão as soluções que a infraestrutura vai impor", garante.
Num cenário em que há que saber como se vão gerir os ativos já existentes, num negócio que entrou em modelo de maturidade típica e que "obriga a concentrar na cadeia de valor e em ganhar dinheiro", António Ramalho destaca a importância da sensorização, da internet das coisas, do big data e dos novos providers de informação. Estes são desafios e oportunidades para as TIC, que terão que ganhar capacidade de resposta para o setor dos transportes ultrapassar os constrangimentos com que ainda se defronta. Aproveitar todo o potencial das TIC nestas áreas permitirá novos modelos de gestão dos ativos e a disponibilização ao mercado ofertas diferenciadoras.
E enquanto representante das infraestruturas, garante que haverá " alterações profundas no modelo de gestão da circulação. Com gestão à distância e com pouca intervenção humana. É bom que os gestores de infraestruturas pensem nisso, porque se não o fizerem serão outros a trabalhar este aspeto. Como já aconteceu na gestão da informação, que era propriedade da infraestrutura e é hoje um ótimo negócio dos gestores tecnológicos. Porque a infraestrutura nunca percebeu que tinha aqui um negócio".
SETOR EM TRANSFORMAÇÃO CONVERGENTECristina Dias, Presidente da Transportes Intermodais do Porto e Vice-presidente da CP, diz mesmo que o setor é "um setor em transformação convergente". Com a população cada vez mais concentrada nas grandes cidades, os transportes têm o desafio de ajudar no crescimento sustentável e verde. Especialmente os transportes públicos, que vão "ajudar ao crescimento, competitividade e coesão". Cada vez mais, este mercado assenta em sistemas inteligentes, que devem ser intermodais, integradores e inclusivos. E aqui, as tecnologias são "instrumentais para o setor evoluir".
"Num tempo em que temos clientes cada vez mais exigentes e recursos cada vez mais escassos, temos que olhar de forma muito parcimoniosa para os nossos ativos e como é que os vamos rentabilizar", considera, destacando que Portugal em excelentes exemplos de como os sistemas de informação ajudam aprestar o melhor serviço ao cliente. Como no caso da bilhética sem contacto. Por isso, o desafio que deixa às TIC é de que "olhem para o mercado público e para a suas reais necessidades e qual deve ser efetivamente o foco da nossa atividade. O futuro passa por nos libertarmos das atividades que não nos trazem mais-valias para o que de facto estamos focados em fazer. As TIC ajudam a agilizar isso e trazem inovação no fazer".
Não tendo dúvidas que os transportes são "recetores absolutos da inovação que as TIC nos podem trazer para vendermos mais", defende que é preciso ter "sistemas de informação que nos ajudem a criar, a cresce e a aportar valor". "O setor é fornecedor de excelência do big data. Mas precisamos de saber como fazer e o que fazer para poder fazer crescer a receita. Ainda estamos a olhar para o parque infraestrutural que temos, que é antigo e apensar como é que possamos começar a fazer a externalização do que não é core para a nossa atividade".
Mas o movimento de modernização dos transportes através das TIC já não é de agora. Até porque o setor percebeu que o driver do crescimento e da melhoria da qualidade do serviço tem que ser a inovação, que permite sustentabilidade e novos produtos que respondem às necessidades do mercado. Para Silva Rodrigues, Assessor da administração do Grupo Barraqueiro, está generalizada a ideia de que o foco do setor está no utilizador. É este foco que permite melhorar o desempenho, tanto em termos de produtos e serviços como de melhoria da sustentabilidade. Tendo sempre em conta que "os mercados e os clientes são diferentes. E que neste setor, a segmentação não pode deixar de estar presente. Temos que ser capazes de pensar com alguma disrupção".
Mas, mais do que os transportes, é o tema da mobilidade que tem que ser pensado. "Porque as necessidades de mobilidade vão ser crescentes e temos que ser capazes de ir ao encontro e antecipar respostas que possam colmatar e melhorar o que são as necessidades dos diferentes mercados", refere este orador. Que não tem dúvidas de que "as cidades têm vários problemas que se vão acentuar", sendo necessário encontrar soluções de transportes que garantam sustentabilidade ambiental, energética e financeira, assim como competitividade às cidades. Por isso, "há que fazer alguma reflexão sobre os transportes e reinventar os modelos de negócio que se mostraram insustentáveis", nomeadamente em temas como a contratualização do serviço publico, o seu financiamento ou a regulação do setor, onde há muito trabalho a fazer.
PARCERIAS PARA CRIAR VALORPara Silva Rodrigues "temos problemas que temos que resolver, exigindo-nos imaginação e criatividade para pensarmos em novas respostas", que terão que ter em conta a segmentação dos mercados e as adequadas ofertas. Aqui, áreas como a bilhética poderão ajudar a conhecer o mercado e as suas necessidades, através da produção de dados. Por isso, é importante que as empresas TIC se assumam como "parceiros de negócio e percebam que há parcerias que se poderão desenvolver com interesse para os dois setores. E com interesse para a sociedade". Porque há um enorme potencial de melhoria e de crescimento. Alerta ainda para a necessidade de, para se ter sucesso, haver "uma perspetiva de sistema e uma gestão integrada do sistema. Em Portugal, não há um dono do sistrema. Cada operador, público ou privado, vai fazendo o que pode, quando e como pode".
Tendo todos os operadores uma verdadeira panóplia de informação, falta a "gestão integrada da informação adequada e a efetiva capacidade no big data, para perceber o que é relevante para o negócio. E aproveitar isso em benefício do cliente e da empresa, aportando valor". Neste âmbito, é preciso ter soluções intermodais e de co-modalidade. E ter capacidade para definir o que é core para o negócio, externalizando as demais atividades. "Este é um novo modelo de negócio para qualquer empresa, perante a escassez de recursos e a necessidade de rentabilização dos ativos. Temos que olhar para quem faz melhor e mais barato. Estamos num setor que o que faz não é barato", pelo que a adopção de soluções standartizadas é um caminho. Mas o "grande desafio é criar-se um espirito de parcerias. Percebendo que o crescimento de uns depende dos outros e que nos podemos potenciar. Temos que saber criar valor para as nossas empresas, setores e economia".
E perante esta realidade, como se posiciona um fornecedor de infraestruturas, tendo em conta que os investimentos dos transportes pararam? De acordo com João Salgueiro, Director Business Development, Product and Innovation da Thales, a empresa está a focar-se no fornecimento das tecnologias e de soluções. A que acresce a preocupação "de ir buscar financiamento que ajude e responda aos desafios e expetativas dos operadores de transportes". Este é "um desafio e um problema para os fornecedores de tecnologia" a que há que saber dar resposta, com uma mudança de mindset e "dentro de padrões razoáveis".
Destaca que "a essência está no espírito de parceria. Tem que existir mesmo. Ganhando e aprendendo uns com os outros. Quando uma das partes é deixada sem espaço de manobra, não é parceria. Tudo se resume ao equilíbrio numa parceria em que ambos ganham". A Thales está ainda a criar um innovation hub em Portugal para pegar em ideias e converte-las em serviços e soluções para o mercado, "porque há necessidade de adaptação e de trabalhos de costumização", numa altura em que a Internet das coisas e o big data são uma realidade e há que saber aproveitar toda a informação que pode ser retirada da rede e dos clientes e transformá-la em valor.