As democracias enfrentam desafios crescentes perante o avanço das autocracias e o aumento da radicalização, impulsionada pela tecnologia. E ganhou particular expressão com a situação que se vive nos Estados Unidos, desde que em janeiro Donald Trump voltou à presidência. Para a renomada jornalista e historiadora americana, vencedora do Prémio Pulitzer, "este é um momento para a Europa pensar o que quer. Se quer viver num mundo onde os impostos se pagam e as regulações funcionam, ou se vai permitir que os standards democráticos desaparecem. É um momento de turning point".
Começando por destacar que "a história não é inevitável e não há um padrão" e que "tudo o que acontece amanhã depende do que fazemos hoje. Não podemos pensar a política assim", Anne Applebaum diz que "vivemos um momento em que a mudança tecnológica e as diferentes tecnologias estão a ser boas para os regimes antidemocráticos, facilitando-os. Com a vigilância que a tecnologia permite, assim como o controlo de sentimentos, as formas de controlo que começaram no sistema da China foram exportadas para outros países e estão disponíveis para mais maus atores usarem. Tudo está disponível para os ditadores". E está preocupada com a a exportação destes modelos de controlo digital.
Contudo, a ameaça não se restringe apenas aos regimes autocráticos. É que as mesmas tecnologias estão a ser usadas para minar as democracias internamente:"Ao mesmo tempo, as tecnologias estão a ser usadas para dividir e politizar as populações nos países democráticos. Na nossa sociedade, os mesmos perfis de controlo estão a vender publicidade, por via de gerar zanga nas pessoas e provocar-lhes a cólera. Não há formas de debate público, onde toda a gente entende as regras. E estão a aumentar a autocracia, com o uso do poder para minar a democracia", alertou, apontando para a polarização e a erosão do debate público.
Perante este cenário, Anne Applebaum defende uma mudança de paradigma no uso da tecnologia. "Tem de se pensar em como a tecnologia pode ser usada para construir consensos, para juntar as diferentes partes da comunidade e construir pontes. Para trazer mais transparência ao sistema, com a regulação. Há muito espaço para o social media pensarem como usar as ferramentas para criar consensos e factos, ao invés de teorias da conspiração e rumores. Temos de encontrar um caminho para o fazer", propôs, destacando o potencial da tecnologia para promover a união e a verdade.
A sua análise estendeu-se ao uso da economia como uma ferramenta estratégica por parte de potências autocráticas. "Na última década, especialmente a Rússia e a China começaram a usar o comércio e a economia para construir a sua estratégia e minar as relações comerciais. Demorou muito tempo ao mundo democrático perceber o que se estava a passar. Já deveríamos ter começado há uma década, mas continuamos a dar poder ao mundo autocrático", criticou, apontando para a lentidão das democracias em reagir a esta nova forma de influência.
Destacou ainda a questão do "dark money" e a facilitação de um mundo financeiro ilegal. "Nos países democráticos seguem-se as regulações. Mas há muitos países do mundo que não operam com regras e sim sombra. Trabalham para evitar a regulação e esconder dinheiro, que é roubado do mundo democrático. Como o dark money nas campanhas políticas americanos. Facilitámos o crescimento e expansão deste mundo ilegal, que existe e é anónimo. Poderia ser terminado, se nos juntássemos como grupo de nações livres para o combater. Não o fizemos ainda", denunciou, apelando a uma ação conjunta das nações livres.
Anúncio foi feito no Congresso por Giorgia Abeltino, da tecnológica